A moça era bonita, se chamava Fabíola e me perguntou como nascia uma crônica. Entre outras
coisas. Ela era repórter do jornal da universidade de Ouro Preto e estava me entrevistando, uma tarefa que
eu não desejo a ninguém, enquanto uma câmera de TV gravava tudo.
Dei a resposta de sempre. Qualquer coisa pode originar uma crônica. Às vezes, há um assunto em
evidência que você é obrigado a comentar. Às vezes, é uma coisa, assim, impressionista; às vezes, é pura
invenção, uma frase que sugere uma história, ou um cheiro no ar, ou um incidente banal... Os mistérios,
enfim, da criação. Etcetera, etcetera. Não há vezes em que as ideias simplesmente não vêm? Há, há.
Acontece muito.
Com os anos, as ideias parecem que vão ficando cada vez mais longe, enquanto o seu poder de
convocá-las diminui. Você chama e elas não se aproximam. Você grita por socorro e elas continuam longe,
lixando as unhas. Você espreme o cérebro e não pinga nada. E hoje nenhum cronista que se respeite pode
recorrer ao velho truque de, não tendo assunto, escrever sobre a falta de assunto. Ou desperdiçar papel caro
e o tempo do leitor com um parágrafo inteiro só de introdução.
Terminada a entrevista, a moça tira um livro meu da sua bolsa. Vai pedir meu autógrafo. Mas ela
mesma usa a caneta para escrever alguma coisa no livro antes de passá-lo para mim. Estranho. Ela está me
dando meu próprio livro autografado por ela? Leio o que ela escreveu: "Luis: a sua braguilha está aberta".
A minha braguilha estava aberta. Passeei por Ouro Preto e dei toda a entrevista com o zíper da calça
aberto. Naquela situação em que, na infância (...), nossas mães avisavam que o passarinho poderia fugir.
Felizmente, meu passarinho já se resignou ao seu lugar. Nada de mais apareceu, a não ser que a câmera
tenha flagrado algo. E eu disse para a Fabíola que ali estava um exemplo de como nasce uma crônica. Eu
fatalmente usaria aquilo, num dia de ideias distantes